Opus Angelorum: uma comunidade de combate!
Na meditação precedente tratamos da grande luta espiritual que perpassa toda a história humana, sobretudo nestes tempos, que, aliás, exigem de nós uma atitude constante de vigilância e discernimento. Vimos também que Deus, em sua misericórdia, aponta-nos os Santos Anjos e sua Obra como auxílio e remédio certeiros e eficazes. Resta-nos agora compreender qual é a essência e a natureza desta Obra. Ela, de fato, não se reduz a um mero movimento devocional; é, na verdade, um grito de alerta, um despertar para compromissos muito sérios da vida cristã! Vejamos o que nos diz o Estatuto da Obra dos Santos Anjos a esse respeito, na seção intitulada ‘Natureza e significado da OA’ (N. 4):
“A natureza da Obra dos Santos consiste numa colaboração íntima dos Santos Anjos, unidos a Deus, e dos homens redimidos, tendendo a Deus” – e, em seguida, aponta a finalidade desta colaboração: “com o significado e o fim: a) de um crescente conhecimento de Deus e amor a Deus; b) de uma poderosa glorificação de Deus; c) do empenho comum pela edificação e consolidação do Reino de Deus na terra.”
Com o fim de salientar ainda mais o caráter e a missão da OA, o Estatuto prossegue com uma frase muito esclarecedora e que, a um só tempo, lança-nos no núcleo da especificidade da OA:
“A OA entende-se a si mesma como uma comunidade de combate com os Santos Anjos sob o manto protetor de Maria, a Rainha do Universo e a Mãe dos homens”.
O grande desejo de Deus ao dar-nos a Obra dos Santos Anjos não foi apenas intensificar o conhecimento e a devoção aos nossos irmãos celestes. Seu desígnio dirige-se à formação de um grande exército espiritual na Igreja, uma real comunidade de combate. Deste modo, podemos dizer que a Obra dos Santos Anjos é declaração aberta de combate aos poderes ameaçadores das trevas. O grito de renúncia, outrora proferidos solenemente em nosso Batismo e Crisma, é agora reafirmado com novo vigor apostólico, de mãos dadas com os Santos Anjos.
No fundamento da comunidade estão os alicerces de uma íntima colaboração. Isto é um ponto crucial para bem compreendermos a dinâmica do combate. Observem aqui o qualificativo deste empenho: fala-se de uma íntima colaboração. Portanto, o que se pede aqui não é uma simples ajuda mútua, ocasional e intermitente; mas uma colaboração intensa e duradoura, alimentada por amorosa relação de intimidade com os Santos Anjos. Logo mais à frente, veremos como essa união se concretizará. Aproveitando aqui de uma célebre passagem agostiniana, podemos dizer que, com eles, nos tornamos “um só coração e uma só alma orientados para Deus”.

E é por isto que o Estatuto nos fala de uma comunidade combatente. Não há dois grupos de combate, como que justapostos; aos olhos de Deus, formamos um único exército sob o manto protetor de Maria. É neste sentido que Mãe Gabriele entendia ao dizer que, ingressando na Obra, o homem “é admitido nas fileiras dos Santos Anjos”. Alguém poderia objetar ser esta comunhão um sonho ilusório, pois tantas são as diferenças entre nós e os espíritos angélicos.
É claro que não somos Anjos, puros espíritos e unidos definitiva e eternamente a Deus; somos homens, pessoas de alma e corpo, espírito e matéria, a caminho da união eterna com Deus e, assim, submetidos à prova. Temos, todavia, em comum com os Anjos o fato de sermos pessoas, de natureza intelectual, dotados das faculdades do intelecto e da vontade. Partilhamos com eles a mesma meta: Deus, a participação da vida divina, a visão bem-aventurada de Deus, a união com Jesus Cristo, em quem todas as coisas, no céu e na terra, devem estar reunidas.
Aliás, lembremos que, pela graça batismal, já começamos aqui na terra a participar misteriosamente da vida divina. Fomos enxertados em Cristo e, n’Ele, integrados na comunhão dos Santos e, portanto, também na comunhão com os Anjos, especialmente com o Anjo da Guarda. Nunca nos esqueçamos da alegria que o nosso Batismo proporcionou ao nosso Anjo. Foi uma data memorável, um passo a mais em direção à comunhão com o nosso Anjo. Na OA, ela se intensifica ainda mais. Podemos, portanto, verdadeiramente cooperar (colaborar) com os Santos Anjos em sua Obra, pois temos tanta coisa em comum. Creiamos: não existe somente a diversidade entre Anjos e homens, mas há também coisas em comum.
Recordemos ainda que a iniciativa é sempre de Deus e de seus Anjos. Eles são os guias, são eles que nos convocam para lutarmos corajosamente contra o pecado e a sedução dos espíritos malignos; principalmente, pela salvação das almas, pelos sacerdotes e religiosos e, por fim, para a maior glória de Deus, reconduzindo todas as criaturas para Ele.
O apelo dos Anjos a um sério e dedicado empenho de renovação espiritual na Igreja esteve presente desde o início da OA. Ultrapassam-se, aqui, os limites da simples devoção. Mãe Gabriele escreveu certa vez: “Todos sentimos dentro de nós, em grau maior ou menor, as exigências dos Anjos. Eles querem fazer-nos render mais do que se observa num bom cristão comum […]”
A propósito, a Mãe explica que: “O chamado de Deus para lutar, ao lado dos Santos Anjos, contra o maligno e seus cúmplices é para nós um sacudir para acordar e uma admoestação que não podemos deixar de escutar.” Em outro momento, afirma que: “A Obra dos Santos Anjos’ é bem mais do que um trato familiar de uma alma com os espíritos sobrenaturais. É um grito de alerta muito forte e muito claro da parte dos Anjos para um combate vindouro que há de ser conduzido com todas as armas do Espírito para a glorificação de Deus […]”.
Em outra ocasião, dirigindo-se aos membros da Confraria, a Mãe escreveu: “Vós vos esforçastes, na mão dos vossos Anjos, para ser bons cristãos. Porém, agora deveis tornar-vos cristãos combatentes […] Deus quer que luteis ao lado dos Anjos por Cristo, o Ressuscitado. Ele quer também que na batalha pelo Reino de Deus formeis uma tropa inquebrantável”.
Há quem espere dos Anjos apenas proteção e consolo, um mero assistencialismo espiritual. A Obra dos Santos Anjos, porém, insere-se em outra perspectiva. Os membros da OA, antes de tudo, constituem-se por aqueles que ouviram e corresponderam ao chamado dos Anjos. Quem são eles? Além de servos de Deus, mensageiros e adoradores, são também combatentes. Por isso, “a natureza da Obra dos Santos Anjos é um patentear das causas, da necessidade da luta contra o maligno, o espírito perverso, é um pôr ao nosso alcance todos os auxílios para esta luta contra o maligno”. É como se estes irmãos celestes nos dirigissem aquela mesma exortação da Escritura: “Vinde, ó alma. Despertai! Corramos para o combate que nos é proposto!”.
Ora, querer isentar-se desta responsabilidade é já assumir a própria derrota; quem assim o faz, ignora de algum modo o sentido de sua vocação cristã. Pensemos, por exemplo, no dia da nossa Confirmação. Não foi ela um autêntico grito de guerra contra Satanás e suas obras? O combate destina-se a todos. A diferença, porém, está em como iremos combater e com quem combater. E é exatamente aqui que a Obra dos Santos Anjos se apresenta como um caminho eficaz para a realização da nossa vocação, agregando na luta espiritual de cada dia o socorro dos nossos irmãos celestes. Quando lutamos intimamente unidos aos Anjos, associados à sua força e sabedoria infalíveis, que diferença! Eles não apenas sustentam a nossa fraqueza e nos defendem do mal; como verdadeiros bons pastores de nossas almas, eles se ocupam também da nossa vida interior, corrigindo-nos e educando-nos na virtude.
Por isso, Deus nos convida a fazermos parte, decididamente, das fileiras de combate destes irmãos celestes. Que nos associemos ainda mais à Sua Obra, para a maior glória de Deus e salvação das almas, sobretudo dos sacerdotes e consagrados.
Como fazer parte desta comunidade de combate? Como tornar-se um autêntico combatente junto aos Santos Anjos? De que maneira irá se concretizar aquela íntima colaboração entre Anjo e homem de que falávamos acima? É o que veremos na próxima meditação. Descobriremos que, na espiritualidade OA, existe um belíssimo caminho espiritual que nos liga ainda mais intensamente aos Santos Anjos e nos coloca sob o influxo de sua proteção e educação: trata-se do caminho ascensional das Consagrações – ao Anjo da Guarda, a todos os Santos Anjos e a Consagração Expiatória. Cada uma delas, a seu modo, representa um passo em direção à união mais perfeita com Deus e à Sua vontade. Nelas, vislumbramos a especificidade do caminho de santificação dentro da OA, a nossa “corrida rumo ao combate”.
Neste caminho de ascensão, de mãos dadas com os Anjos, seremos não apenas preparados para a luta espiritual – porque, de fato, ninguém se torna um bom combatente da noite para o dia –, mas principalmente nossa vocação cristã será levada ao pleno desenvolvimento, à maturidade da fé e à perfeição da caridade. O que os Santos Anjos seguramente desejam é fazer com que a vida de Cristo reine e vivifique em nossas almas, tornando-se o centro de toda a nossa existência – “Corramos… com os olhos fixos em Jesus”. E somente radicados em Cristo poderemos formar uma comunidade de combate capaz de “imbuir a Igreja inteira de um novo fogo santo, de nova coragem, de nova energia, de novo amor”, como nos ensinava Mãe Gabriele.
