Hoje, dia 07 de setembro, junto à comemoração da independência do nosso país, celebramos a memória do Santo Anjo do Brasil que, apesar de não ser mais uma memória litúrgica, não perdera seu aspecto de memória salutar à consciência de todos os brasileiros e, de modo particular, à dos cristãos.
Romano Guardini vai dizer que “O homem hodierno, também o religioso, não possui mais relação com seu Anjo[1].” Tal sentença aplica-se muito bem a grande parte do povo brasileiro que, ao comemorar sua independência de Portugal, relega sua dependência aos Santos Anjos – e, por conseguinte, sua dependência de Deus – colocando-os de lado e reduzindo sua relação com eles a orações pueris, ou, até mesmo, “orações” esotéricas de movimentos como Nova Era, que estão mais para superstições do que para um pedido sincero, nascido de uma fé viva na presença e existência dos Santos Anjos fundamentado na tradição cristã.
Que cada pessoa humana – de modo particular os batizados – possui um Santo Anjo que o guarde e acompanhe, atesta o catecismo quando afirma, sob dogma de fé, que “cada fiel é ladeado por um anjo como protetor e pastor para conduzi-lo à vida.[2]” Não obstante, cada povo, pais ou região também está sob os auspícios de um Anjo Santo, como ensina São Tomás de Aquino[3]. A grande questão inserida dentro da realidade sobrenatural da ação e existência dos seres angélicos é aquilo que Romano Guardini atesta: “O homem hodierno, também o religioso, não possui mais relação com seu Anjo”.
O estiolar-se da crença e da relação com os Santos Anjos, consequência da deletéria luz, advinda da razão moderna e de suas filosofias, coloca-nos dentro de um combate hercúleo contra os demônios, o mundo e a nossa natureza decaída, pois eles são os servos enviados a auxiliar os homens para que se cumpra o desígnio divino de salvação[4], ou seja, são aqueles que nos transmitem as graças e nos conduzem até Cristo, sua Igreja e aos Sacramentos.
Não devemos esquecer também do poder contido em um ser angélico, e que, segundo a vontade de Deus, fara todo o possível com essa força, a fim de cumprir a missão recebida. Temos o exemplo do Anjo que protegeu os Israelitas na fuga do Egito, manifestando-se em uma coluna de fogo gigantesca que os separava do exército do faraó[5] e do Anjo que exterminou cerca de 185 mil homens do acampamento assírio[6]. Contudo, mesmo que o Anjo possua força suficiente para realizar tais feitos, nada pode fazer diante de um povo que não crê verdadeiramente em Deus, nem sequer o teme e muito menos acredita e se relaciona com Seus Anjos.
De fato, relacionar-se com os Santos Anjos está para além de uma devoção infantil, de recitar, semiconsciente, uma oração decorada, mas
é um estar consciente da presença e grandeza dessas criaturas que possuem
olhos claros e imersos na Luz de Deus,
corações dilatados e ardentes de amor por Deus,
mãos hábeis e cheias do auxílio e da graça dadas por Deus.
Relacionar-se, em seu nível mais elevado, é possuir uma densidade de consciência da pessoa com a qual nos relacionamos, capaz de preencher de presença o lugar e o tempo em que estamos, tornando-nos um com ela, ao passo que, esse encontro causa uma expansão do modo como enxergamos a realidade.
Deste modo, cada um de nós, brasileiros, devemos, com sincera dedicação e amor, buscar uma íntima união com o Santo Anjo da guarda do nosso país, que assim como Brasil é belo, forte, impávido colosso, ele também o é, e além disso, é sem dúvidas, um raio vívido, de amor e de esperança que à terra desce, apenas se o formoso céu da nossa vida, risonho e límpido, resplandecer a imagem do cruzeiro, isto é, se vivermos sob contemplação contínua da Cruz de Cristo.
Portanto, o relacionar-se com os Santos Anjos, com nosso Santo Anjo da guarda, com o Santo Anjo da guarda do Brasil, levar-nos-á a consciência clara do caminho que estamos seguindo em contraste com o caminho desejado por Deus. Nos fará perceber que, o caminho verdadeiro passa pela imitação de Cristo na Cruz, que necessitamos urgentemente do “Pão dos Anjos” que é a Santíssima Eucaristia, e de Maria, a serva, que está diante de Deus como Mãe de todos os brasileiros, Rainha de todos os Anjos e Rainha do nosso Brasil.
[1] Romano Guardini, Engel theologische Betrachtungen, Topos Taschenbücher 252. Original em alemão. Tradução feita pelo autor.
[2] CIC 336.
[3] S. Tomás, S.Th. I,113,1;
[4] CIC 332.
[5] Cf. Ex 14, 19-20
[6] Cf. 2Rs 19, 35